Francisco
Anysio de Oliveira Paula Filho (Maranguape 1931 - Rio de Janeiro 2012) é um dos
nomes marcantes da história da comunicação brasileira. Ator, humorista,
escritor, pintor, comentarista, diretor e radialista, profissão esta que sempre
faz questão de citar entre as suas atividades, é o foco desta pesquisa. Este
texto busca relatar a história do menino nascido na pequena cidade de
Maranguape, no Ceará, que se tornou uma referência para o humor brasileiro. A
atenção fundamental está na relação estabelecida entre Chico e o rádio em seu início
de carreira e a influência do meio radiofônico em sua trajetória artística.
A
infância e a ida ao Rio de Janeiro
“O
fato de ser nordestino significa que estar vivo já é um grande prêmio”
(CHICO ANYSIO)
Nasceu
em 1931 em Maranguape em um sítio que ainda pertence a um membro distante da
família. Um dos cinco filhos de Dona Haydée e seu Francisco (Elano, Lupe,
Lilia, Chico e Zelito). Sua infância foi cercada das meninices de sítio e
banhos de rio, que eram segundo ele, um Éden que carregou pelo resto de sua
vida.
O
pai era proprietário de uma empresa de ônibus, o que garantia certo nível
financeiro. Chico diz que a família era “quase-rica”, sendo que seu Francisco
era chamado de coronel pelos moradores da cidade. Mas um dia a empresa pegou
fogo e tudo que eles tinham foi perdido. Anysio afirmava que com oito anos
ficou pobre e sem saber por que se viu com a família embarcando no Itapajé indo
para o Rio de Janeiro, cidade onde iria construir sua carreira artística, embora
não soubesse disso tão novo.
Chico
ainda se recorda em chegar à cidade maravilhosa em um dia de domingo. “Eu
estava no Rio, com oito anos, calças curtas, um pé enorme e uma magreza
inacreditável”, escreveu em suas memórias". (CHICO ANYSIO).
O
futebol começou cedo em sua vida, já que seu pai era presidente do Ceará
Sporting e o time ficava concentrado no sítio da família antes dos jogos. No
Rio, passou a torcer pelo Vasco só para contrariar o pai que era botafoguense.
Estudou
no Atheneu e após uma reprovação, foi transferido para o Zaccaria, depois para
o Anglo-Americano. Como o menino tinha uma atenção maior ao futebol do que aos
estudos, acabou indo para o Colégio Interno Independência, onde passou o pior
ano de sua infância, pois a estrutura era muito ruim, incluindo comida
estragada. Com isso, dona Haydée o levou de volta ao Atheneu.
Ele
era garoto e matava aulas para ir para a Quinta da Boa Vista jogar bola com os
amigos ou ainda ia ao Cinema Trianon ou ao Capitólio para ficar a tarde inteira
assistindo às sessões com trailers, documentários e jornais americanos. Nessa
fase, descobriu que tinha facilidade para imitar as vozes dos locutores do
cinema, mas até então não tinha pensado nisso profissionalmente.
A
entrada no Rádio
A
falta de dinheiro o incomodava, pois era o único da turma que não podia ir ao
cinema nem ao futebol sem pedir dinheiro à família. Então como conseguir alguns
trocados? Foi quando um amigo de futebol sugeriu que ele tentasse os programas
de calouros, pois segundo ele, Chico imitava todos os locutores tão bem quanto
o Zé Vasconellos. Esta idéia acabou levando o garoto a escrever em um caderno
velho 28 piadas para um número. Ele se lembra da primeira apresentação:
“Eram
cinco páginas que eu segurava com as mãos e os joelhos tremendo. Somente minha
irmã Lilia sabia que eu até já tinha feito a inscrição no programa
Papel-Carbono, do Renato Murce, líder de audiência na Rádio Nacional”
(CHICO ANYSIO)
Toda
a família acreditava que ele havia ido ao futebol e depois para a casa de um amigo,
mas Chico foi sozinho para a Nacional, onde fez o ensaio às três da tarde e
ficou esperando até o momento de entrar no palco. Foi quando Suzy Kirby
anunciou “ cópia número nove. Uma cópia de vários locutores. Francisco Anysio
Filho”.
Ele
entrou e foi recebido pelo apresentador de quem lembra com carinho, pois “ele
travava todos os candidatos com muita dignidade”. O contra regra, vendo o papel
nas mãos do jovem tratou logo de colocar tudo sobre uma estante para
partituras. O rapaz respirou fundo e fez sua apresentação.
Foi
um grande sucesso, tanto que ao sair, Francisco recebeu abraços de
profissionais da Nacional. Ao final, veio a notícia de que, com 399 votos,
havia vencido o programa naquele dia 7 de setembro de 1947.
Assim,
o garoto vindo de Maranguape recebeu seu primeiro cachê de cento e cinquenta
mil réis, que usou para comprar uma bicicleta para o irmão mais novo, Zelito.
Chico
continuou indo aos cinemas para aperfeiçoar as imitações e passou a ganhar
praticamente todos os programas de calouros em que ia. Chegando a também
participar dos programas da capital paulista, onde também venceu no programa “A
Hora do Pato” apresentado por Vicente Leporace.
Mas,
o grande apoio foi dado pelo apresentador do programa de mesmo nome no Rio de
Janeiro. Jorge Cury, que não só tratou Francisco como profissional, como ao
final do programa deu-lhe um abraço e cochichou “Você vai longe garoto!” Para
o jovem nordestino esta frase ecoou por toda a sua vida.
No
mesmo ano, Anysio já tinha decidido começar sua carreira e para isso passava o
dia ouvindo rádio para saber onde poderia colocar seu trabalho, lembrando
sempre que na Nacional, a vaga de imitador já estava ocupada por José
Vasconcellos.
Assim,
Francisco decidiu levar seu portfólio de imitações para a Rádio Guanabara, onde
por seis meses foi religiosamente de segunda a sexta-feira para tentar falar
com o diretor. A secretária pedia um momento e ele se sentava na ante-sala. Um
dia o diretor abriu a porta para falar com o contínuo e só encontrou o menino
magricelo. Sem poder fugir questionou: O que você quer? E Chico de susto
respondeu: quero entrar para o rádio.
O
diretor da Guanabara rebateu de pronto: isso todos querem, mas o que você faz
de diferente? Sou imitador, respondeu o menino. Então, levando Chico para a
porta de saída disse: “me traga um programa de imitações, para vermos o que
pode fazer”.
Chico
Anysio voltou para casa e passou o final de semana escrevendo seu primeiro
programa. Na volta levou consigo as folhas que acabaram lhe garantindo um
programa às terças às cinco da tarde, mas sem nenhuma remuneração. Depois de
alguns meses, o diretor da emissora demitiu o imitador justificando pouca
audiência. Para o rapaz isso foi o ponto final em sua carreira. Passou a fazer
suas imitações apenas para sua irmã Lilia e estudar para se tornar advogado.
Mas
nesse momento, a carreira de ator entrou de volta em sua vida. Foi em um final
de semana quando ia jogar bola com os amigos no campo do Fluminense e havia uma
imposição: todos deveriam participar descalços para não estragar a grama. Lá
estava ele, aguardando os amigos, quando soube que o jogo havia sido
transferido para o Aliança, onde não se poderia jogar sem um calçado, pois o
campo era de terra batida.
O
jovem Chico foi buscar seu tênis quando encontrou em casa a irmã Lupe e o amigo
da família Oromar Terra, ambos de saída. Por sorte, iam para a Rádio Guanabara
para fazer um teste de atores. Nesse instante, Chico foi convencido pela irmã a
ir. O resultado foi que conquistou o sétimo lugar como ator e terceiro como
locutor. Entre os 25 aprovados estavam Nádia Maria, Beatriz Segall, Antonio
Carlos, Batista Rodrigues, entre outros atores. E entre os locutores, o
primeiro lugar ficou com o também iniciante Silvio Santos. Deste dia em diante,
Francisco Anysio passou a ser um profissional de rádio fazendo o horário da
meia noite às três da madrugada na locução.
Com
isso, passou a chegar em casa às quatro e não conseguia mais acordar às sete
para ir ao colégio. Assim deixou a vida acadêmica, ganhando quatrocentos mil
réis por mês trabalhando na rádio.
Um
bom salário para a época, mas Chico começou a ficar endividado, pois apostava o
que tinha e muito mais em corridas de cavalos. Mesmo parando ainda ficou devendo
para os agiotas. Em um momento de aperto, foi salvo por um amigo locutor. Raul
Longras o convidou para ser o repórter atrás do gol nos jogos em que irradiava
pela Guanabara. Com isso, levantou o valor necessário para saldar as dívidas e
aprendeu mais um ofício dentro da emissora.
Além
disso, assistiu grandes nomes do futebol carioca e brasileiro jogando diante de
si. Chico lembra com saudade desse período e afirma que a Rádio Guanabara era
uma família onde faziam tudo juntos desde os programas diários até os
especiais. Porém, o período bom durou até 1949, quando a emissora foi vendida
para Adhemar de Barros que pretendia utilizar a força da rádio para elegê-lo
presidente. Com isso, mudou a direção da empresa que passou a ter uma linha
ideológica em sua programação desagradando a todos os profissionais da casa.
Tanto que vários se demitiram, como Fernanda Montenegro e Carlos Lacerda, que
antes aproveitou o seu horário no ar para dizer categoricamente que era a
última vez naquela rádio, pois não trabalhava para ladrão.
Com
este processo de desmantelamento da emissora, Francisco foi para a Mayrink
Veiga, mas não deu certo, pois brigou com o diretor, o sr. Varela, e foi
demitido. Na saída da rádio, encontrou Ronaldo Lupo, para quem tinha escrito os
diálogos para dois filmes. No saguão da emissora, o amigo ligou para Arnaldo
Pinto, dono da Rádio Clube de Pernambuco, oferecendo o trabalho de Chico. O
empresário fechou por telefone com Lupo um contrato de três anos com aumentos
de salários sucessivos ano a ano.
Em
Recife, Anysio, com 19 anos, não conseguiu o mesmo sucesso e não conseguiu ser
aceito pelos colegas, pois todos sabiam que ele ganhava mais que os demais.
Além disso, ele não conseguia afinar os textos para serem interpretados pelos
atores locais e tinha contra si o novo diretor da emissora, Otávio Augusto
Vampré. Após nove meses, a situação ficou insustentável. Foi quando Chico
recebeu uma carta do irmão Elano, também radialista, acenando com a
possibilidade de um contrato com a Rádio Clube do Brasil.
Com
esta proposta a mão ele foi falar com o proprietário da Rádio de Pernambuco que
aceitou de pronto sua saída. Mas ainda havia dois anos e três meses para o fim
do contrato. Em caso de demissão o ator teria de pagar uma multa. Como não
tinha dinheiro para resgatar sua dívida, Francisco conseguiu que o empresário
concordasse em receber em textos enviados semanalmente. Eles fecharam que o
redator enviaria três programas por semana. Assim, Chico conseguiu voltar ao
Rio de Janeiro para trabalhar na Rádio Clube do Brasil sob a direção artística
de Dias Gomes e geral de Sérgio Vasconcellos.
Logo
após chegar a emissora, Vasconcellos o chamou em sua sala e disse em voz baixa
que estava indo para a Nacional e que o levaria consigo, mas que para isso ele não
poderia fechar contrato com a Rádio Clube. Dessa forma, Chico passou a se
esquivar de Dias Gomes que sempre tentava fazê-lo assinar a papelada.
Três
meses se passaram e Sérgio realmente foi para a Rádio Nacional, a mais bem
posicionada nas pesquisas e a que detinha a equipe mais bem paga. Chico ficou
esperando o telefonema do amigo com o convite irrecusável, mas isso não
aconteceu.
Ao
invés disso, um corte de 50 funcionários na Rádio Clube deixou Anysio sem
emprego novamente. Já que estava sem contrato foi um dos demitidos. Dessa
forma, o ator tomou coragem e foi até o prédio da Nacional falar com
Vasconcellos. A secretária pediu que esperasse. Depois de quatro horas, Sérgio
saiu da sala, abriu um sorriso e perguntou: “E então? O que é que deseja? Que é
que manda?” Deixando claro que não tinha a intenção de contratá-lo.
Esta
situação abre o pior período profissional de Chico Anysio, onde passou seis
meses sem conseguir um emprego, vivendo na casa da mãe com o dinheiro dado
escondido pela irmã Lupe. “Eu sofria uma dor estranha. Não era apenas o
desemprego que doía, mas a raiva de ter sido enganado, um descrédito nas minhas
possibilidades, uma desconfiança sobre meu talento e a possibilidade de nunca
mais arranjar emprego”, descreveu o ator.
Na
falta de emprego em rádio consegui uma vaga de contínuo no Sindicato dos
Economistas e aproveitava para fazer o serviço mais rápido para dar uma
passadinha nas emissoras.
Um
dia, foi à Rádio Tupi falar com o diretor Paulo de Grammont que o recebeu e lhe
ofereceu uma vaga. Embora desconfiado da bondade do profissional, Chico acertou
o salário e desceu pensativo em tudo o que tinha acontecido.
Indo
para casa alguém o chamou. Era Haroldo Barbosa que perguntou onde ele estava
trabalhando. Ele respondeu que acabara de acertar com a Tupi. Porém, Haroldo
disse que um grupo de atores tinha saído naquele dia da rádio e que iam para a
Mayrink Veiga e que ele (Chico) iria com eles. No caminho para a nova emissora,
Barbosa explicou que o grupo era formado por Nancy Matinhos, Antonio Maria,
Cesar Ladeira e Luiz Jatobá, além de Zé Trindade, Antonio Carlos, Duarte Moraes
e Abel Pêra. Na chegada a Mayrink, Haroldo abriu a porta do diretor Gilson
Amado e disse para que ele contratasse Chico, pois “o garoto era bom” e ele era
seu avalista. E assim foi feito. Na rádio tudo iria muito bem pelos próximos
cinco anos.
Chico
passou a comandar três programas noturnos: Este Norte é de Morte (segunda-feira,
às oito), Me dá Meu Boné (quinta-feira, às nove e meia) e Angel Maria Canta (às
oito e meia de sexta-feira). Depois entraria em outros tantos programas da
emissora sempre com seus tipos e vozes.
A
saudade dessa solidariedade profissional levou Francisco a escrever em suas
memórias:
“...
havia
uma convivência saudável e romântica naquele tempo do rádio. Encontrávamo-nos
diariamente e sabíamos, sempre, dos problemas de cada um. Não foi a televisão
quem afastou os artistas do convívio dia a dia, mas o progresso da televisão.
As emissoras diversificaram seus estúdios, ampliaram as gravações para
externas, inclusive. O videoteipe separou a gente". (CHICO ANYSIO)
A
chegada da TV
Em
1957, pelas mãos de Haroldo Barbosa, Chico já tinha passado pela Atlântida,
escrevendo roteiros para os filmes do amigo, quando foi escalado por ele para
fazer um papel no programa “Aí vem a dona Isaura”, interpretada por Ema
D´avila, na TV Rio, somando então dois empregos: um na Rádio Mayrink Veiga e
outro na televisão. Nesse momento Chico Anysio percebeu a força no novo veículo
e afirma ter sentido a queda de audiência do rádio:
“A
televisão começava a dominar o rádio. Isso me dava uma pequena dor por dentro,
porque o rádio sempre foi para mim uma escola da maior importância. Foi no
rádio que eu aprendi, que me criei. Não me trazia nenhuma felicidade esse
nocaute que a televisão se preparava para impor ao rádio e muito me desagradou
o rádio ter jogado a toalha, entregado a luta” (CHICO ANYSIO).
Infelizmente
o rádio perdeu seu espaço no centro das atenções populares nos anos seguintes
para a TV, mas foi nesse período, na TV Rio, que Chico teve seu contato mais
criativo com os demais profissionais tanto do humor, como do recém-chegado
veículo, a televisão.
Após
a TV Rio, ele ainda passaria na Excelsior, voltaria para a TV Rio após uma
discussão com Carlos Manga, de onde foi para a Record de São Paulo e por fim
para a TV Globo onde ficou mais de 30 anos como funcionário. Dessas idas e
vindas, Chico Anysio se lembra de alguns profissionais com grande carinho por
acreditar que eles participaram ativamente de sua formação profissional.
Embora
tenha sido a televisão que tornou Chico Anysio um ator conhecido nacionalmente
foi o rádio a sua grande escola e de onde veio boa parte de seus personagens.
O
foco deste texto é exatamente essa passagem do jovem Francisco pelos estúdios
das emissoras brasileiras. Por isso, não vou aprofundar a pesquisa no sentido
de sua carreira televisiva, mas na radiofônica.
A
influência dos amigos na carreira
Aquela
boa acolhida entre os profissionais de rádio do Rio de Janeiro, jamais foi esquecida
por Francisco. Tanto que em seu livro de memórias cita vários amigos e
companheiros que influenciaram sua vivência artística.
O
primeiro a quem Chico diz dever muito é José Vasconcellos, pois a amizade teve
início ainda na infância, pois Zé era irmão de Tuneca, que fazia parte da sua
turma de meninos do bairro. Além disso, José já era um humorista consagrado por
suas imitações quando Francisco iniciou sua carreira tendo o amigo do irmão
como modelo. Atualmente José vive em Itatiba, interior de São Paulo, mas ainda
mantém contato com Chico.
Grande
Otelo foi outro professor e amigo. Eles trabalharam juntos no rádio e também em
chanchadas onde Chico afirma que ele e Roberto Silveira “seguraram muitas
barras” de Othelo, indicando que o ator bebia, se envolvia com mulheres,
brigava e faltava nas gravações. Mas sempre era perdoado por todos, pois ele
fazia “cara de arrependimento” e ninguém tinha coragem de demiti-lo.
Na
lista de ícones que ajudaram Chico está Carlos Manga, a que ele atribui um
talento absoluto como diretor e a didática necessária para indicar caminhos aos
atores nos estúdios ou nos sets de filmagem com firmeza e segurança:
"Aprendi
(com Manga) que para dirigir com firmeza e segurança, para conseguir um
trabalho tranquilo e sem atropelos, não é preciso gritar e dizer palavrões. O
diretor pode se impor com um silêncio marcado e um olhar fulminante. Isso
garante respeito de todos, o que é melhor para todo mundo. Com uma direção
firme todos trabalham melhor e mais rápido. Valeu ao Manga o fato de ser um dos
melhores atores desse país”. (CHICO ANYSIO)
Também
não podemos deixar de registrar a admiração dele por Antonio Maria, a quem
acredita ser o autor mais original que já escreveu humor no país. Credita ao
escritor a criação de alguns dos melhores textos, mais brilhantes e
inteligentes que teve o privilégio de ler. Chico diz que quando começou na
Mayrink Veiga era o texto de Maria que procurava imitar. Após ser deixado pela
mulher, Maria passou a beber mais que o normal e a escrever crônicas, entre
elas uma das melhores na opinião de Chico, “Brasileiro, profissão: esperança”.
Na madrugada do dia 15 de outubro de 1964, Antonio Maria parou na porta do
restaurante Le Rond Point para trocar um cheque e teve um infarto fulminante.
“Morria ali uma glória da arte popular do Brasil” diz Chico.
Haroldo
Barbosa de certa forma foi além de amigo um “avalista” de Francisco ao levá-lo
para a Mayrink Veiga. Para o jovem cearense, Haroldo foi o primeiro a acreditar
em seu trabalho como autor de textos humorísticos e como ator. Ele chamava
Chico de garoto e ensinava:
“... quando há um cômico em cena, tudo que ele disser tem
de ser engraçado. Se não der para ter graça, ele tem que falar de um modo
diferente do comum. O cômico é especial. Não use, nas falas de um cômico, uma
linguagem neutra. Se não tiver num dia bom e a graça vier com dificuldade,
procure, no mínimo, ser inteligente. Dez piadas ótimas não reabilitam uma
bobagem”
(CHICO ANYSIO).
Outra
personalidade reverenciada na biografia de Chico é José Bonifácio Sobrinho, o
Boni, ex-diretor da TV Globo, de quem Anysio afirma:
“Não
existe, no mundo inteiro, ninguém que entenda de televisão mais que o Boni. A
rapidez de raciocínio, o faro do sucesso, a mão de comando, a justiça das
decisões, a imparcialidade, o talento, a palavra certa na hora exata, tudo nele
funciona como um Rolex” (CHICO ANYSIO).
Na
mesma turma estava Walter Clark, a quem Anysio chama de o melhor diretor
comercial de tv que já conheceu. Segundo ele, ninguém vendia mais e melhor do
que ele uma programação. Foi Clark que vendeu o primeiro projeto de Chico na TV
Rio e depois o incentivou a produzir mais.
Outro
diretor de TV a quem o humorista credita parte de sua carreira é Daniel Filho,
com quem trabalho na TV Rio, Excelsior e na Globo. Segundo Chico, ele sempre
deu palpite mais do que certos nos programas onde trabalharam juntos.
Entre
os nomes gravados na memória do humorista está o da atriz Dercy Gonçalves que
descreve como a “maior artista cômica do mundo” e a pessoa por quem nutre
grande respeito.
Todas
estas pessoas e outras tantas passaram pela vida de Francisco Anysio
enriquecendo sua carreira com a criação de papéis em programas, dicas de como
atuar, de como escrever, de como dirigir. Eles tiveram um papel decisivo na
criação da base do trabalho de Chico no rádio e na TV facilitando elaboração
das concepções de ator e de autor:
“O
ator é o veículo através do qual o personagem se apresenta. Quando faço um
papel qualquer, é necessário que saia de mim para o personagem entrar e viver.
Ele tem que ter seu próprio gestual e seus tiques. Nada de mim pode estar nele.
Ou se houver, que seja o mínimo. Somo dois: eu e o personagem... é imperioso
que alguém ou alguns possam encontrá-lo sem minha presença ... O autor, o
escritor, vive outro tipo de delírio. Pelo fato de ser criador, ele precisa ter
alguma vivência. Ninguém pode escrever bem sobre uma coisa que não conhece. Por
essa razão eu frequentei todos os ambientes possíveis. O autor escreve melhor
quando sabe o que está escrevendo. O ator representa melhor quando sente”
(CHICO ANYSIO).
Outro
aspecto que o fez diferente dos demais humoristas foi sua aprendizagem na
escola do improviso do texto radiofônico, onde os atores deviam estar
preparados para qualquer situação. Além disso, um artista na época não era tão
conhecido como na atualidade, um contraponto a superexposição vivida pelos
artistas hoje diante dos meios de comunicação.
“Como
estímulo ou desconsolo. Hoje às coisas são mais fáceis, porque há mais
profissionais. O passado foi mais romântico. A televisão atualmente faz um
ídolo em dois capítulos de novela. Não há apenas O Cruzeiro e Revista do Rádio
para oferecer a possibilidade de capa. Hoje há uma fartura de revistas
divulgando o rosto das estrelas e dos astros, tudo rápido. Mas, é óbvio, existe
um lado escuro nesta vasta claridade: um mês depois da novela acabar, poucos
lembram sequer do título dela” (CHICO ANYSIO).
Os
laços de Chico Anysio com os profissionais de rádio perduram até hoje. No
período que antecedeu sua saída da TV Globo, ele foi alvo de críticas pelo uso
de profissionais da velha guarda no programa “Escolinha do Professor Raimundo”,
sobre este assunto o humorista rebate explicando que valorizar estes atores é
uma escola:
“Muita
gente acha que utilizo os velhos comediantes simplesmente para os ajudar.
Enganam-se. Utilizo-os muito mais por esperteza. Eles me ensinam sempre. Não há
dia em que eu não aprenda uma coisinha a mais com eles... Infelizmente há os
que vêem nos comediantes da antiga “coisas superadas”. Idiotas, os que pensam
assim. A Escolinha do Professor Raymundo é chamada por grande parte da crítica
de velharia. Ridículos críticos que não aprenderam que um programa que
apresenta Brandão Filho, Antônio Carlos, Grande Othelo, Zezé Macedo, Walter
D´Ávila, Nélia Paula, Jayme Filho, Mário Tupinambá, Berta Loran, Nádia Maria e
outros desse padrão, não tem por que ser chamado de velharia, mas de faculdade”
(CHICO ANYSIO).
Fora
do ar...
A
carreira de Francisco teve uma virada após os anos 90. Com a entrada de Marluce
Dias da Silva na direção da TV Globo, ele foi colocado de lado e retirado do ar
gradativamente. Esta convivência turbulenta teve um ponto alto quando o ator
deu uma entrevista à Revista Isto É onde fez declarações contundentes contra a
emissora. Em uma das respostas à jornalista Celina CORTEZ (2000) ele disse:
“Não é
a Globo que me julga ultrapassado, é a doutora Marluce. Mas não me interessa a
opinião dela, do Roberto Marinho ou do Fernando Henrique Cardoso. A opinião do
povo é o que me interessa. Trabalho para as classes C, D e E. Quando essa gente
achar que estou superado, paro de fazer televisão”.
Na
mesma entrevista ele coloca a diferença entre a gestão de Boni e de Marluce à
frente da emissora do Jardim Botânico.
“Não
tenho nada contra a direção da doutora Marluce (Dias da Silva), só que acho o
seu método muito estranho. Pela primeira vez, em 47 anos de tevê, trabalho numa
casa onde ninguém tem acesso à pessoa que nos dirige. Suas ocupações são
muitas, porque ela não delega. Só quem resolve é ela. Com Boni não era assim.
Para a Globo, a direção dela é melhor, porque economiza mais. Os programas têm
saído piores, o diferencial da Globo em relação às concorrentes sempre foram os
gastos”.
Estas
e outras entrevistas caíram como uma bomba no meio artístico e especialmente na
TV Globo, onde em dezembro de 2001 fez seu último programa (Escolinha do
Professor Raimundo), pois a emissora o retirou do ar alegando que o formato estava
desgastado. Desde então as aparições do ator são em papéis curtos em novelas e
minisséries como Sítio do Picapau Amarelo (2005), Sinhá Moça (2006) e Pé na
Jaca (2007).
Chico
Anysio por Chico Anysio
Infelizmente
profissionais como Chico Anysio não encontram mais espaço nos veículos de
comunicação brasileiros. Seja pela falta de visão dos gestores ou pelo simples
preconceito do trabalho desse brilhante humorista, que está fadado ao
esquecimento das próximas gerações. Seus personagens ilustraram boa parte dos
últimos 40 anos da história nacional, sempre com críticas sociais e
intelectuais a uma situação vivenciada pela população. Ele próprio reconhece
que o rádio foi sua maior escola e ao avaliarmos seu percurso profissional,
podemos perceber que muitas de suas criações foram produzidas a partir da
convivência com Haroldo Barbosa, Antonio Maria e tantos outros com quem
conviveu nos primeiros anos de sua carreira nas principais emissoras de rádio
do Rio de Janeiro.
“Eu sou um grande apaixonado pelo rádio,
porque tudo que eu sei eu aprendi no rádio. O rádio de hoje, no entanto, ficou
restrito aos comunicadores e isto faz com que os atores procurem as dubladoras,
para usá-las com aprendizado. Não sei se é correto estimular alguém a entrar
para o rádio, se este alguém não tiver uma linda voz (para vir a ser locutor)
ou um grande desembaraço e improviso (para ser um comunicador)”.
Seu
perfil de workaholic sempre o levou a trabalhar em todos os espaços que
conseguia. Tanto que registrou em sua carreira as ações de locutor, narrador,
galã de novelas de rádio, locutor e comentaristas de futebol, ator, novelista,
redator, tele ator, escritor, compositor, imitador e pintor. Suas contribuições
ao humor no Brasil não podem deixar de serem registradas e seus ensinamentos
apreendidos diante do momento em que vivemos uma ausência de criatividade tanto
no rádio como na televisão. Mas poucos têm a humildade de aprender com Chico e
com os demais atores que vieram do rádio. Por isso, vivemos em um país sem
graça.
BIO
Thiago
Muniz tem 33 anos, colunista dos blog "O Contemporâneo", do site
Panorama Tricolor e do blog Eliane de Lacerda. Apaixonado por literatura e
amante de Biografias. Caso queiram entrar em contato com ele, basta mandarem um
e-mail para: thwrestler@gmail.com. Siga o perfil no Twitter em @thwrestler.
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
ResponderExcluirAMIGO VC N É FÁCIL KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
BOA SEMANA!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSensacional Marcos...kkkkkkk
ResponderExcluirChico Anysio era um gênio da criação, atuava em praticamente todas as vertentes artísticas.
Grande Abraço!!!
Adorei a postagem! Extremamente rica e acrescentou muitos pontos sobre o chico que eu não sabia. Aliás, não há como não se apaixonar por um excelente ator como ele. Sem palavras...
ResponderExcluirBeijos,
Monólogo de Julieta
Obrigada,amiga!
ExcluirVolte sempre!
Obrigado Paloma!!!
ExcluirVolte sempre!
Bjs